Recentemente divulgada pela imprensa, a notícia de uma não confirmada relação entre o uso de contraceptivos orais por adolescentes e o aumento de risco de câncer de mama é considerada completamente irresponsável pela classe médica.
Representantes de algumas das principais entidades de especialidades ligadas ao tema, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO) e Sociedade Brasileira de Mastologia, afirmam que até o momento não existem dados consistentes que suportem essa conclusão.
Segundo o dr. Marcelino E. H. Poli, presidente da Comissão Nacional de Anticoncepção da FEBRASGO, a promoção da anticoncepção entre adolescentes é uma obrigação de saúde pública. Ele frisa, aliás, que por todos os benefícios advindos do uso dos contraceptivos orais, deve ser incentivada e patrocinada pelos responsáveis pela saúde pública.
“Estamos vivendo uma época de verdadeira explosão sexual, em que a precocidade do relacionamento sexual é incentivada por todos os meios, o erotismo é exagerado e a gravidez na adolescência uma epidemia, com conseqüências muito sérias”.
Outro agravante apontado pelo dr. Nilson Roberto de Melo, presidente da FEBRASGO, é que mais de um milhão de mulheres por ano se envolvem em situação de abortamento inseguro no Brasil, com complicações que vão desde hemorragias, infecções, perfuração uterina, esterilidade e até a morte.
“O aborto inseguro é uma das principais causas evitáveis de morte materna, e um dos responsáveis pelos altos índices apresentados no país: 64 mortes por 100 mil nascidos vivos. O principal meio de reverter esta realidade é a redução das gestações não desejadas. Portanto, não podemos descartar nenhum método anticoncepcional, ainda que outros, como a camisinha, sejam mais indicados por outras razões, entre elas a prevenção às doenças sexualmente transmissíveis”.
A afirmação é sustentada por dados alarmantes divulgados na mais recente Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher: no Brasil, a fecundidade de mulheres entre 15 e 19 anos representa 23% da taxa total, e cerca de 33% das meninas com até 15 anos já tiveram relações sexuais. O estudo também aponta que, das jovens sexualmente ativas, entre 15 e 19 anos, 66% já usaram algum método contraceptivo. Mais de um terço delas, ou 27%, optou pela pílula.
“Sem a opção do anticoncepcional oral, é impossível dizer se estas jovens teriam utilizado outro método, ou se estariam, hoje, somadas às estatísticas de gestações indesejadas, abortos inseguros ou de mortalidade materna”, conclui dr. Nilson.
Anticoncepção na adolescência
A anticoncepção na adolescência é uma questão delicada, pois envolve um ser biologicamente adulto, com capacidade procriativa, mas emocionalmente imaturo.
“Na adolescência, os contraceptivos orais combinados gozam de vantagem sobre os demais métodos, tornando-os preferenciais especialmente por proporcionarem benefícios extracontraceptivos, que devem ser enfatizados, facilitando sua escolha”, afirma o dr. Poli.
Entre os benefícios, ele ressalta a diminuição do risco de cistos funcionais; regulação do ciclo menstrual, possibilitando a previsibilidade das menstruações; redução da duração e do volume do fluxo menstrual, bem como da dismenorréia; e proteção contra doença inflamatória pélvica.
Contra-indicações
Apesar de todos os benefícios para a grande maioria dos casos, há exceções em que a pílula anticoncepcional não é indicada. Mas essa é uma constatação que deve ser verificada individualmente pelo médico. Por isso, o uso de anticoncepcionais, assim como acontece com qualquer medicamento, só deve ser feito sob prescrição e orientação médica.
Segundo o presidente da Sociedade Brasileira de Mastologia, dr. Carlos Ricardo Chagas, as contra-indicações não estão relacionadas aos estudos sobre o uso da pílula e a incidência de câncer.
“Embora algumas pesquisas mostrem uma probabilidade maior na incidência – a maioria baseadas em doses e substâncias antigas – o risco encontrado ainda é muito pequeno. Ou seja, a pílula continua fazendo mais bem do que mal para as mulheres”, defende.
O especialista lembra que os trabalhos mais recentes, que incluem novas formulações, com doses mais baixas, não têm observado aumento de risco.
“A pílula é um método seguro, conveniente e bem tolerado em um alto número de pacientes. Com a grande variedade de formulações disponíveis atualmente, pode ser feita uma escolha individualizada para cada paciente”, conclui.
ai/UNO