O governo federal anuncia hoje o marco regulatório que guiará a exploração de petróleo da camada do pré-sal. O presidente Lula, decidido a vender a esperança de que o pré-sal financiará a redenção econômica e social do Brasil, quer transformar o evento numa espécie de celebração nacional, com a presença de ministros, governadores, artistas e sindicalistas. Mas faltou convidar o meio ambiente para a festa.
Desde que o país foi informado sobre a quantidade de petróleo estocada na camada do pré-sal, discutiu-se muita coisa. Debateu-se técnicas para retirar tanta riqueza de área tão profunda, formas de financiar a sua exploração e até a criação de uma outra estatal petrolífera. Os governadores correram atrás de royalties que ainda nem existem para seus estados. O governo federal prometeu que com o dinheiro desse petróleo, acabará de vez com a pobreza.
Mas a única vez, em meio à cacofonia do pré-sal, que se discutiu seus aspectos ambientais foi por iniciativa da imprensa, que procurou a Petrobras para saber o que a empresa pretendia fazer acerca das emissões de carbono geradas pela exploração dos novos poços. Ela respondeu que pretendia usar a tecnologia de Captura e Armazenamento em Carbono, conhecida a partir de sua sigla em inglês, CCS, para impedir a emissão das milhões de toneladas contidas nos poços do pré-sal.
"A questão é que essa tecnologia é experimental e não estaria tecnicamente viável antes de 2030" diz Ricardo Baitelo, coordenador da Campanha de Energia do Greenpeace. Além desses obstáculos, a CCS também terá que ultrapassar barreiras financeiras. "O custo total do uso da CCS para capturar o que se estima seja algo entre 12 e 18 bilhões de toneladas de carbono contidas no pré-sal pode chegar ao longo de todo o ciclo de exploração a centenas de bilhões de reais", continua Baitelo.
Cálculos do Greenpeace indicam que, se a CCS não cumprir tudo o que a tecnologia promete, e o Brasil estiver usando todas as reservas estimadas do pré-sal, estaremos emitindo ao longo dos próximos 40 anos em torno de 1,3 bilhão de toneladas de CO2 por ano só com refino, abastecimento e queima de petróleo.
"Ainda que o desmatamento da Amazônia seja zerado nos próximos anos, tudo indica que as emissões decorrentes do pré-sal podem anular o seu impacto positivo e manter o Brasil entre os três maiores emissores de CO2 do mundo", alerta Baitelo. Num mundo que enfrenta uma crise climática sem precedentes e onde já se criou um consenso entre os países de que é fundamental evitar que o aquecimento médio da Terra ultrapasse os 2º graus centígrados, seria normal imaginar que o governo brasileiro estivesse trabalhando duro na busca de soluções para reduzir ao máximo os impactos ambientais do pré-sal.
Uma alternativa, talvez a mais relevante, está justamente onde ele será explorado: no mar. "Os oceanos são um importante regulador climático", explica Leandra Gonçalves, coordenadora da Campanha de Oceanos do Greenpeace. "Eles funcionam como o maior sumidouro de carbono do planeta, com capacidade para absorver até 50% das emissões geradas pela atividade humana".
Uma maneira de garantir a perpetuação desta função está na criação de áreas marinhas protegidas, que ainda trariam o benefício adicional de proteger nossos estoques pesqueiros e a biodiversidade do litoral brasileiro. Mas área marinha protegida é o tipo do assunto que não entra na agenda do governo. Muito menos na agenda do pré-sal. O presidente Lula sequer pensou em destinar recursos da sua exploração para a criação e manutenção de reservas marinhas. E isso, no futuro, pode ter consequências graves. Se a concentração de emissões não for reduzida ao longo dos próximos anos, os oceanos podem passar de mocinhos a bandidos na luta contra o aquecimento global.
"O aumento das emissões tem efeito nocivo nos mares, porque elas contribuem para o aumento médio da temperatura da água. Mares mais quentes tem menos capacidade de absorção de CO2", continua Gonçalves. Além disso, concentrações excessivas de CO2 provocam acidificação nos oceanos, comprometendo a saúde dos corais, berços importantes da biodiversidade marinha. "No Brasil, já foram detectados indícios claro de decadência de estruturas de corais na costa de São Paulo e em Abrolhos, no litoral baiano". O pré-sal é nosso. Mas sua poluição também. Está mais do que na hora de o Brasil discutir como se livrar dela.
Fonte: Assessoría de Imprensa