domingo, dezembro 22, 2024

Quando roncam as motosserras

O desmate na Amazônia voltou a crescer entre os meses de agosto e dezembro de 2010, conforme os registros do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais divulgados na edição de quinta-feira (3/2) do jornal O Estado de S.Paulo.

Ainda não se pode afirmar que tenha ocorrido uma reversão na tendência de queda do desmatamento, comprovada nos dois anos anteriores. Isso porque, segundo o jornal, o Deter – Sistema de Detecção de Desmatamentos em Tempo Real – é muito ágil mas pouco preciso. Seus satélites não registram imagens através das nuvens e só detectam o desmatamento quando a mancha alcança dimensões acima de 25 hectares.

A notícia é preocupante, entre outras razões porque o controle do desmatamento da Amazônia deve responder pela quase totalidade das metas de redução de emissões de gases do efeito estufa com as quais o Brasil se comprometeu. Outro motivo para colocar em alerta as autoridades e a opinião pública é o fato de que as cicatrizes se aproximam do coração da floresta, atingindo áreas dos estados do Amazonas, Acre e Tocantins cujo patrimônio ainda é pouco conhecido.

Ações suspeitíssimas

Os dados ainda precisam ser confirmados por outros sistemas de monitoramento, mais precisos porém mais lentos, mas os sinais de regressão são muito fortes. Mato Grosso e Pará se destacaram pela ação das motosserras nos meses de novembro e dezembro e tudo indica que os desmatadores aproveitam os períodos em que a formação de nuvens na região atrapalha a “visão” dos satélites.

Isso significa que os destruidores da floresta estão entrando numa fase de mais eficiência, com mais organização e planejamento, o que exige uma estratégia diferenciada dos defensores do meio ambiente. Portanto, também é necessária uma atenção especial da imprensa para os fatores múltiplos e integrados que afetam as chances de sobrevivência da floresta. Por exemplo, quanto teria influenciado, na aceleração do desmatamento, a forma leniente com que a imprensa tratou o projeto de flexibilização do Código Florestal?

Observe-se que os cortes e queimadas ocorreram justamente no período em que a bancada da motosserra mais se movimentou, no segundo semestre do ano passado, para apressar a aprovação do controverso relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP).

Falta transparência

Enquanto isso, prosseguem os planos para a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu. A coluna “EcoVerde”, do Globo, publica na quinta-feira (3) uma consulta a dez especialistas reconhecidos internacionalmente. Quatro se declaram a favor da obra, quatro contra e outros dois disseram que não têm condições de opinar, porque faltam informações oficiais seguras sobre o projeto, sua necessidade, suas consequências e as garantias de minimização do impacto sobre a região amazônica.

Ao que tudo indica, falta transparência à governança desse e de outros projetos relativos à Amazônia.

O governo se arma com bons técnicos, mas muitos deles são domesticados por uma política que não é clara, principalmente porque a imprensa nunca se preocupou em entender o que é a Amazônia e como ela pode ser integrada a um projeto nacional de desenvolvimento sustentável.

O noticiário ainda fica na superfície da questão, como no caso dos registros sobre desmatamento, mas raramente penetra nas variáveis que eventualmente agravam os riscos sobre o maior patrimônio ambiental do planeta.

Contra a ignorância

Mas nem só de Amazônia se alimentam as preocupações dos ambientalistas. Os jornais de quinta-feira também noticiam, com mais destaque no Globo, que a Mata Atlântica está em quinto lugar entre as dez florestas mais ameaçadas do mundo, segundo o ranking divulgado pela ONG Conservação Internacional.

Os dados são de longo prazo, o que não indica que os cuidados de preservação realizados nas últimas décadas possam ser relaxados.

Os deslizamentos recentes no Estado do Rio e os desastres que acontecem todos os verões em áreas de encostas nas regiões Sul e Sudeste são o retrato mais convincente das consequências do desmatamento.

A ONU proclamou 2011 como o Ano Internacional das Florestas. Trata-se de uma boa ocasião para a imprensa brasileira planejar uma cobertura ampla e esclarecedora sobre a importância de preservar esse patrimônio, pois muitos brasileiros ainda acham que a proteção de árvores é parte de objetivos conspiratórios das ONGs internacionais.

Contra a ignorância, informação neles.

Por Luciano Martins Costa, do Observatório da Imprensa

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