Antes de se tornar escritor, quando foi prefeito de Palmeira dos Índios (AL), no final dos anos 1920, Graciliano Ramos escreveu, num de seus famosos relatórios ao governador Álvaro Correa Paes: “Procurei sempre os caminhos mais curtos. Nas estradas que se abriram, só há curvas onde as retas foram inteiramente impossíveis.” Embora falasse literalmente de rodovias, o prefeito alagoano também se referia, metaforicamente, ao seu implacável rigor em relação aos gastos públicos. Sem pretender ter o mesmo brilho literário, devo dizer que procuro seguir seus passos em matéria de gestão.
Ninguém desconhece que Lorena, tanto quanto os outros municípios, sentiu na pele os graves efeitos da crise econômica mundial. De uma expectativa de crescimento de 12% no orçamento que projetávamos para este ano, espera-se agora um crescimento próximo de zero. Pior, estima-se também que a queda de arrecadação do município chegue a 15%. Também sofremos muito com a diminuição das receitas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), embora, neste caso, exista a promessa do Governo Federal de repor as perdas deste ano. Tais dados indicam que, além de eliminar o crescimento de 2008, a crise diminuiu a capacidade de gastos públicos do município.
Ora, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF, Lei 101/2000) determina que os municípios não podem gastar mais que 60% do orçamento com despesas de pessoal. Como 6% dessa despesa dizem respeito ao custo do Poder Legislativo, resta ao Executivo o teto de 54%. Na prática, os gastos são ainda maiores, uma vez que os cálculos são feitos sobre a Receita Corrente Líquida e não sobre o orçamento nominal. O próprio Tribunal de Contas do Estado (TCE) emite um alerta quando as despesas atingem a cifra de 49,3% do orçamento.
Assim, para respeitar a LRF, a Prefeitura de Lorena tomou uma decisão difícil, o necessário corte de 10% na folha de pagamento. Esta decisão foi tomada de maneira absolutamente aberta e transparente e teve a preocupação de não afetar o atendimento prioritário que a administração municipal dispensa aos setores de Saúde, Educação e Assistência Social.
Ainda assim, foi mantida a reestruturação que fizemos ano passado no funcionalismo, quando criamos um plano de cargos e salários, visando a melhoria dos rendimentos de várias categorias profissionais que gerou um aumento de custos.
É necessário lembrar que Lorena gasta quase 30% de seu orçamento geral na Saúde e outros 27% na Educação – a Constituição Federal determina o investimento de 15% na Saúde e 25% na Educação. Não queremos de nenhuma maneira diminuir o nível dos gastos sociais, tão essenciais para o bem-estar da população. Já havíamos optado por eliminar recursos destinados a determinadas obras que, embora necessárias, podem ser adiadas. Agora, novos cortes se fazem necessários. Então, mesmo cortando na carne, vamos preservar as conquistas sociais do povo de Lorena. Temos a certeza de que, tão logo a tempestade se dissipe, voltaremos a crescer em ritmo acelerado, sempre ampliando o horizonte da inclusão social.
Nunca é agradável cortar postos de trabalho. Mas em algum momento de suas carreiras, os políticos, sejam de qual orientação ideológica forem, têm de escolher entre a ética da responsabilidade – que diz respeito ao interesse coletivo -, e a ética da convicção – que remete aos valores individuais do dirigente. Quando opta pela primeira, o governante põe a comunidade acima de suas convicções pessoais – mesmo sob o risco de ser criticado. Faz parte do jogo democrático. Afinal, Graciliano Ramos reconhecia que jamais conseguira agradar a todos, mas dizia que “nos limites a que nos coagem a gramática e a lei, ainda nos podemos mexer”.
por Paulo Neme
UNOPress
