segunda-feira, dezembro 23, 2024

Secas severas na Amazônia deixam cientistas em alerta

Um novo estudo liderado pela Universidade de Leeds (Reino Unido) e pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) revela que a seca de 2010 na Amazônia pode ter sido ainda mais devastadora para suas florestas do que a seca de 2005, antes considerada a mais grave da região nos últimos cem anos. Análises publicadas pela revista Science sobre as chuvas da estação seca de 2010 em uma área de 5,3 milhões de km² na Amazônia indicam que a seca daquele ano foi mais generalizada e mais grave do que em 2005. Uma equipe composta por cientistas britânicos e brasileiros calcula que a seca daquele ano pode provocar a emissão de mais de 5 bilhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) florestal para a atmosfera.

Com base nos novos dados, os cientistas avaliam que, se estiagens extremas como essas se tornarem mais frequentes, os dias da floresta Amazônica como um tampão natural das emissões de carbono produzidas pelo homem podem ser contados.

“A ocorrência de dois eventos dessa magnitude em um intervalo tão curto é extremamente incomum, mas, infelizmente, coincide com os modelos climáticos que preveem um futuro sombrio para a Amazônia”, afirma Simon Lewis, da Universidade de Leeds, um dos líderes do estudo.

A floresta amazônica ocupa uma área de aproximadamente 25 vezes o tamanho do Reino Unido. Em um ano normal, as florestas intactas remanescentes absorvem cerca de 1,5 bilhão de toneladas de CO2, o que tem ajudado a abrandar as mudanças climáticas nas últimas décadas.

Em 2005, a região foi castigada por uma seca que matou árvores de grande porte em regiões de floresta primária na Amazônia, fazendo com que as florestas deixassem de acumular o dióxido de carbono da atmosfera. À medida que entram em decomposição, as árvores mortas liberam CO2 para a atmosfera.

À época, cientistas descreveram o evento como uma “seca que ocorre uma vez a cada 100 anos”, mas a região foi atingida por uma segunda seca extrema apenas cinco anos mais tarde, fazendo com que o rio Negro, afluente do rio Amazonas, baixasse seu volume ao menor nível já registrado.

A nova pesquisa aplicou a conhecida relação entre a intensidade da seca em 2005 e a morte de árvores para estimar o impacto da seca de 2010. A previsão dos estudiosos é a que a floresta amazônica não irá absorver 1,5 bilhão de toneladas de CO2 da atmosfera em 2010 e 2011, e que serão emitidas 5 bilhões de toneladas adicionais de dióxido de carbono na atmosfera uma vez que as árvores mortas pela seca apodreceram. Para se ter uma dimensão desse impacto, em 2009 os Estados Unidos emitiram 5,4 bilhões de toneladas de CO2 resultantes da queima de combustíveis fósseis.

Porém, o pesquisador Paulo Brando, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) afirma que as perdas de carbono não serão imediatas, uma vez que o processo de decomposição de árvores mortas pela seca pode demorar décadas. Também não podemos calcular ainda quanto tempo a floresta irá levar para se recuperar.

Outro integrante do grupo dos pesquisadores, Daniel Nepstad , do IPAM, lembra que os modelos climáticos globais sugerem que estiagens na Amazônia como estas se tornarão mais frequentes no futuro em decorrência das emissões de gases de efeito estufa. De acordo com o cientista, as alterações em ciclos climáticos como o El Nino e o aquecimento do Atlântico Norte causadas pelas mudanças climáticas também podem aumentar a intensidade e frequência de secas na Amazônia.

Situação crítica

“A ocorrência de duas grandes secas, separadas em um intervalo de dez anos, pode compensar largamente o carbono absorvido pelas florestas intactas da Amazônia durante esse período. Se eventos como esses se tornarem mais frequentes, a floresta amazônica chegará a um ponto crítico, no qual deixará de ser um valioso reservatório de carbono para se tornar uma das principais fontes de emissões de gases de efeito estufa”, esclarece Paulo Brando.

O cientista acrescenta que muita insegurança e certa controvérsia ainda pairam em torno dos impactos da mudança climática na Amazônia. Segundo ele, essa nova pesquisa soma-se a um conjunto de evidências, sugerindo que as estiagens se tornarão mais prolongadas, mais intensas e mais frequentes durante o século XXI. “Se a humanidade continuar a emitir gases de efeito estufa, estará jogando roleta russa com a maior floresta tropical do mundo”, diz o pesquisador Simon Lewis, da Universidade de Leeds.

Para os estudiosos, este novo evento de seca severa na Amazônia exige uma reavaliação do futuro da região. Secas e incêndios florestais estão mudando a vida de quem mora na floresta a um ritmo além do que a comunidade achava possível poucos anos atrás. “Populações indígenas sofrem poluição do ar durante esses eventos devido a fumaça dos incêndios florestais, enquanto comunidades ribeirinhos ficam isoladas pelo baixo nível dos rios e produtores rurais não sabem quando plantar” reflete Daniel Nepstad.

A pesquisa é fruto de uma colaboração entre a Universidade de Leeds, Universidade de Sheffield e do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). O trabalho foi financiado pela Fundação Royal Society, Fundação Gordon e Betty Moore e a fundação National Science Foundation (EUA).

Acesse estudo na íntegra em https://www.ipam.org.br

UNOPress/Envolverde/IPAM

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